Trajetória do Esporte Feminino – Parte 2: Lutas e heroínas


Nesta segunda parte será abordada a trajetória de lutas das nossas heroínas no esporte.

O caminho não foi e ainda não é fácil. Cada conquista destas atletas veio e vem carregada de muita luta, principalmente de preconceitos. Por isso, a cada vez que uma delas sobe ao pódio, leva consigo mais do que uma conquista. Leva sua história e de muitas outras mulheres, além de ser inspiração e orgulho para várias outras mulheres que desejam seguir este caminho.

A luta das mulheres na história do esporte é marcada por preconceitos, exploração da sensualização e erotização da mulher, desigualdade de gênero, entre outras. Mas apesar de todos esses obstáculos elas continuam realizando e alcançando seus objetivos.

As primeiras mulheres que tiveram acesso a prática esportiva pertenciam a elite da sociedade. Essas mulheres começaram a praticar esporte a partir da prática de ginástica através do turfe, remo, natação, esgrima, tênis, arco e flecha e o ciclismo. Novidade na época, através do Movimento Ginástico Europeu, os médicos higienistas mudam o discurso sobre os benefícios que os exercícios físicos podem trazer para as mulheres. com isso, vários professores de educação física adotaram este discurso e criaram várias ações, incluindo educacional para formação física e social da mulher.

Todavia alguns especialistas da área da saúde argumentavam que as mulheres não poderiam praticar alguns esportes, como futebol e lutas, por exemplo, porque poderia causa traumas físicos e estéticos. E esses argumentos foram transformados em leis.

A Proibição da prática

Desde os primeiros jogos antigos as mulheres não tinham direito nem de participar nem de assistir. Com o retorno dos Jogos Olímpicos da Era Moderna o pensamento não mudou muito, as mulheres continuaram tendo restrições e só recentemente que as mulheres passaram a disputar em todas as modalidades olimpíadas.

No Brasil, Getúlio Vargas editou o Decreto-Lei 3.199, de 14/4/1941, que segundo o Art.54.Às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza, devendo, para este efeito, o Conselho Nacional de Desportos baixar as necessárias instruções às entidades desportivas do país.” Este decreto-lei foi vigente até 1983.

Em 2 de agosto de 1965, durante a ditadura militar, a Deliberação n.º 7, assinado pelo General Eloy Massey Oliveira de Menezes, Presidente do Conselho Nacional de Desportos (extinto em 1993), decidiu proibir primeiro o futebol feminino e depois neste mesmo ano também proibiu as lutas, futebol de salão, futebol de praia, polo aquático, rugby e baseball. Este decreto foi revogado no final da década de 70, dando início à uma nova fase. Dentre os novos desafios estavam: a falta de estimulo de clubes e federações, a regulamentação do futebol feminino, além do preconceito.

Quem ajudou a mudar

As mulheres queriam participar dos esportes e a partir deste pensamento surgiram “pequenas”, mas importantes atitudes para inclusão do esporte feminino nas olimpíadas.

Para o Barão de Coubertin, responsável pelo retorno dos Jogos Olímpicos na Era Moderna em Atenas no ano de 1896. O Barão achava que as mulheres não deveriam competir nenhum esporte, e que o papel dela seria de procriação e de estar na plateia incentivando seus filhos a vencer. Com isso, em protesto à exclusão das mulheres nos jogos, a corredora grega Stamati Revithi realizou o percurso da Maratona (21 milhas ou 42,195km) fora do estádio no dia seguinte após a realização da prova masculina, com um tempo inferior ao de alguns homens. Seu feito não foi reconhecido e a corredora Stamati não teve nenhum registro oficial sobre seu tempo.

A partir daquele momento as mulheres começaram a exigir mais espaço no meio esportivo, mas o Comitê Olímpico Internacional, comandada só por homens, não permitia a ampla participação feminina, somente em algumas modalidades.

Esta participação foi vista a partir da 2ª edição das Olimpíadas realizada em Paris em 1900. As mulheres só puderam participar de duas modalidades, o golfe e o tênis, pois esses esportes não tinham contato físico e eram esportes bonitos de praticar. Além disso, não recebiam prêmios, só um certificado, pois não eram consideradas atletas. Mas isso não impediu as mulheres de participar das outras edições, pelo ao contrário o número de mulheres só aumentou em cada edição dos Jogos. Esta participação tem relação as outras ações na sociedade por igualdade entre gênero.

Outra ação realizada para inclusão das mulheres nos Jogos Olímpicos veio da francesa Alice Melliat acompanhada de mais 10 mulheres, que foram até Paris para participar dos Jogos Olímpicos da era Moderna. Ela reivindicou junto ao COI (Comitê Olímpico Internacional) a permissão da entrada das mulheres em diversas modalidades, pedido esse que foi acatado de forma não oficial.

Nas Olimpíadas de Paris de 1900, tiveram a presença de 22 atletas, o destaque maior foi para as francesas Sra. Brohy e Srta. Ohnier que competiram no croquet. Elas foram as primeiras mulheres a competirem nos Jogos Olímpicos. Mesmo ganhando a competição não receberam nenhuma medalha de ouro.

Em 1928, o COI decidiu aprovar a inclusão de provas de atletismo para as mulheres nas Olimpíadas, nas modalidades de curta distância. Pois acreditava-se que elas não eram capazes de correr grandes distâncias. Por conta disso, muitas outras mulheres passaram a protestar contra esse pré-julgamento, desafiando as regras ao participarem de provas que até então eram exclusivamente masculinas, como por exemplo, a Maratona de Boston, São Silvestre, entre outras, derrubando a ideia de que as mulheres eram frágeis para longas distâncias. As corridas de longa distância foram parcialmente consolidadas somente em 1984.

Foi em 1936, que o COI decidiu reconhecer de fato as mulheres como atletas olímpicas. Mas elas só passaram a ter direito de participar de todas as modalidades olímpicas em 2012.

Nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1984, ano em que ocorreu a primeira maratona olímpica feminina da história dos jogos, Gabrielle Andersen protagonizou uma das cenas mais impactantes e emocionantes do esporte. Por conta do forte calor, ela cruzou a linha de chegada com câimbras, exausta, mas sem desistir nem um segundo, sendo mais uma motivação para as mulheres na época.

As Inspirações Brasileiras

Em 1932, uma das primeiras mulheres que influenciou as esportistas brasileiras a seguirem seus sonhos foi Maria Lenk. Com apenas 17 anos, ela foi a primeira brasileira e única sul-americana a participar dos Jogos Olímpicos de Los Angeles, na modalidade natação. Ela foi considerada pioneira da natação moderna, além disso, introduziu o nado borboleta durante a prova de nado peito nas olimpíadas de Berlim.

Nas Olimpíadas de Tóquio de 1964, apenas uma mulher representou o Brasil, Aída dos Santos, viajou sem técnico, sem tênis e sem uniforme. Aída terminou a competição em 4º lugar no salto em altura. Além disso, ela foi a primeira mulher a disputar uma final Olímpica.

Em 1996, nas Olimpíadas de Atlanta, elas conquistaram medalhas de ouro e prata no vôlei de praia, de prata no basquete e de bronze no voleibol. As jogadoras de vôlei de praia Sandra Pires e Jaqueline Silva foram as primeiras mulheres a conquistarem o ouro feminino para o Brasil.

Foi somente em 2012, nas Olimpíadas de Londres, que pela primeira vez na história a participação feminina foi em todas as modalidades, ou seja, mais de um século depois que as mulheres conquistaram esse direito.

No Futebol

Em 1881, na Inglaterra, as mulheres fizeram um jogo de apresentação entre as seleções da Inglaterra e Escócia. O Torneio Experimental de Futebol Feminino 1988 foi o primeiro grande passo para a Copa do Mundo Feminina FIFA 1991. A primeira partida oficial feminina no Brasil só foi acontecer mais de 20 anos depois, em 1921 também em São Paulo.  Em 1941, veio a proibição da prática do futebol e outros esportes. Desde então o futebol passou a ser jogado de forma clandestina pelas mulheres até que a sua proibição fosse suspensa em 1979. Após a regulamentação da modalidade em 1983, que o futebol feminino do Brasil conquistou um honroso terceiro lugar na Copa do Mundo realizado em 1999. Foi a partir da década de 90 que também se iniciou a participação da modalidade nos jogos olímpicos. Isso se deu 1996, nos jogos de Atlanta justamente nos Estados Unidos. 

A seleção brasileira feminina disputou sua primeira partida em 1986 contra os Estados Unidos em um amistoso, desde então a Seleção Brasileira Feminina esteve presente em todas as Copas do Mundo Feminina e dos Jogos Olímpicos.

No Basquete

O basquetebol foi criado em 1891 pelo professor de Educação Física canadense James Naismith (1861-1940). O basquete feminino iniciou em 1892 quando a professora de educação física do Smith College, Senda Berenson, adaptou as regras criadas por James Naismith. A primeira partida aconteceu em 04 de Abril de 1896, quando a Universidade de Stanford venceu a Universidade da Califórnia. Neste mesmo ano a modalidade chegou ao Brasil, trazido pelo norte-americano Augusto Shaw. O primeiro torneio de basquetebol no Brasil ocorreu em 1912, no Rio de Janeiro.

O primeiro jogo de basquete olímpico aconteceu nos Jogos Olímpicos de Verão de 1936, em Berlim. As mulheres começaram a disputar o basquete nas Olimpíadas, em Montreal - 1976, os EUA conseguiram a dobradinha dourada em cinco oportunidades. 

O basquetebol feminino brasileiro só começou a jogar em 1992, tendo conquistado dois títulos, prata em 1996 e bronze nas olimpíadas de 2000 

No Voleibol

O vôlei nasceu em 1895 – um ano antes da primeira edição das Olimpíadas   O vôlei entrou no programa olímpico simultaneamente no masculino e no feminino nas olimpíadas de Tóquio em 1968.

O voleibol chegou no Brasil no ano de 1915. Foi neste ano que aconteceu a primeira partida de vôlei na cidade de Recife – PE. Em 1923, aconteceu o primeiro campeonato no Rio de Janeiro, sendo o Fluminense o primeiro clube brasileiro profissional criado.

O voleibol feminino estreou em 1951, com ótima apresentação no campeonato Sul Americano e sendo campeão. Em 1952, foi realizado o primeiro campeonato mundial feminino.

No Futsal

No Brasil a prática do futsal feminino foi oficializada em 08 de janeiro de 1983 pelo extinto Conselho Nacional de Desportos (CND). Para Santana e Reis (2003), a prática do futebol de salão feminino foi autorizada pela FIFUSA (Federação Internacional de Futebol de Salão) em 23 de abril de 1983. 

Por conta da necessidade em expandir a prática do futsal feminino no Brasil, foram surgindo as competições estaduais e em 1992 a CBFS organizou a 1ª edição da Taça Brasil de Clubes adulto feminino. Essa 1ª edição contou com a participação de 10 equipes e foi realizada em Mairinque-SP.

O campeonato brasileiro de seleções adulto feminino aconteceu a partir de 2002, em São Paulo.

Até o momento esta modalidade nunca esteve em uma edição dos Jogos Olímpicos.

No Handebol

Os primeiros jogos internacionais no handebol feminino foram realizados em 1930 entre a Alemanha e a Áustria. Mesmo ano que o esporte chegou ao Brasil. O Campeonato Mundial feminino foi disputado desde 1957.

O handebol feminino estreou nos Jogos Olímpicos em Montreal 1976. Em uma disputa entre seis seleções, a União Soviética sagrou-se campeã. Com o ouro conquistado nos Jogos Pan-Americanos de Winnipeg (Canadá-1999), a seleção brasileira conquistou sua primeira vaga olímpica para os Jogos Olímpicos de Sidney (Austrália-2000). 

Outras mulheres que ajudaram nessa conquista

Charlotte Reinagle Cooper foi uma tenista britânica, que participou das Olimpíadas de Paris em 1900. Ela foi a primeira mulher a conquistar uma medalha de ouro nos Jogos.

Larisa Semyonovna Latynina é uma ex-ginasta artística, nascida na Ucrânia, mas que representava a União Soviética nos jogos. Ela participou das Olimpíadas de Melbourne (1956), de Roma (1960) e de Tóquio (1964). É a mulher que mais conquistou medalhas na história dos Jogos Olímpicos. Foram 18 no total, sendo 9 de ouro. Seu recorde só foi superado em 2012, pelo nadador Michael Phelps.

Norma Enriqueta Basilio Sotelo foi uma ex-atleta velocista mexicana, conhecida por ser a primeira mulher a acender a pira nos Jogos Olímpicos de Verão do México, em 1968. Embora não tenha conquistado nenhuma medalha nessa edição, ela se tornou símbolo da igualdade de gênero no esporte ao participar da cerimônia de abertura acendendo a tocha olímpica.

A carioca Rafaela Lopes Silva é uma atleta do Judô que participou das Olimpíadas do Rio de Janeiro, em 2016. Ela foi a primeira atleta na história do judô brasileiro a alcançar o título de campeã mundial e olímpica.

Miraildes Maciel Mota (Formiga), uma das jogadoras mais velha e que continua na ativa, duas vezes vice-campeã olímpica e uma vez vice-campeã mundial de futebol feminino. Atuando como volante e meia, é a única pessoa do mundo a ter participado, como atleta, de 7 Copas do Mundo (incluindo homens e mulheres) de 1995, 1999, 2003, 2007, 2011, 2015 e 2019. Formiga também é a única futebolista a ter participado de 7 edições dos Jogos Olímpicos (1996, 2000, 2004, 2008, 2012, 2016 e 2020), sendo também a única que participou da modalidade desde que passou a fazer parte das Olímpiadas.

Além da carreira olímpica, outros esportes não olímpicos também tiveram atletas femininas importantes para a igualdade de gênero. Nas lutas, por exemplo, que antes eram proibidas para mulheres em nosso país, podemos destacar os nomes de Adriana Araújo, a primeira boxeadora e medalhista olímpica, a atleta Natalia Falavigna foi a primeira medalhista olímpica na modalidade taekwondo, Maria Cecilia de Almeida Maia (Ciça) do Karate foi a primeira tricampeã mundial e no MMA temos a lutadora Amanda Nunes a primeira mulher da história do MMA a conquistar duplo-cinturões no UFC.

No judô, Ednanci Silva, única brasileira bicampeã pan-americana da modalidade e dona de duas medalhas de bronze em mundiais (1997 e 2003).  Em 1996, nas Olimpíadas de Atlanta, a judoca teve que passar por um teste de feminilidade a poucos dias de sua estreia, prejudicando seu desempenho. Em 2000, em Sydney, uma contusão foi a vilã da vez. Foi só em Atenas que chegou inteira - física e psicologicamente. Porém, perdeu a duas lutas do bronze.

Outras atletas que fizeram história e também subiram ao pódio: Ketleyn Quadros, Maurren Maggi, Fabíola Molina, Sarah Menezes, Yane Marques.

Mesmo com o aumento da participação feminina na última década, ainda falta muito para equilibrar a balança esportiva entre os gêneros. Mesmo com a falta de incentivo e a falta de inclusão das mulheres nos diversos setores esportivos, além das diversas barreiras sociais, como a distinção de gênero, cultura da feminilidade, as mídias, exploração da erotização da mulher e a exclusão social da mesma. Nada disso impediu ou vai impedir as mulheres de conquistarem seu espaço.

Esta segunda parte da trajetória do esporte feminino, mostrou um pouco da luta destas mulheres que ajudaram a motivar e inspirar outras mulheres a praticarem esportes, seja por lazer, por saúde ou por profissão. Afinal de contas, lugar de mulher é onde ela bem quiser – escalando, acampando, viajando, correndo, lutando e fazendo o que bem entender.

Fonte: a luta pela inclusão de todas as mulheres nos esportes. https://www.cartacapital.com.br/blogs/sororidade-em-pauta/a-luta-pela-inclusao-de-todas-as-mulheres-nos-esportes/

https://atletasnow.com/mulheres-no-esporte-conheca-suas-trajetorias-e-conquistas/

https://rainhasdodrible.com/2021/06/12/a-origem-do-futebol-feminino-uma-historia-de-desigualdade/

https://trivela.com.br/inglaterra/o-primeiro-clube-feminino-da-historia-surgiu-ja-lutando-pelos-direitos-das-mulheres/


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